Turminha do Riso, acompanhem este interessante artigo escrito pelo
Zeca Camargo (apresentador do Fantástico), postado em 04 de abril sob o título:
"Como criar humor, fazer amigos, e influenciar pessoas":
Há alguns meses, recebi um email de uma colega jornalista com um link para um esquete de Rafinha Bastos genial – ainda que não exatamente original. Baseado num trabalho do jornalista (e humorista) britânico Charlie Brooker – devidamente creditado no final do vídeo brasileiro – ele mostra como se faz uma reportagem na televisão. É uma engraçadíssima “receita” de uma embalagem surrada e conhecida por todos os telespectadores – e, embora hoje seja possível (e desejável) fugir desse modelo, os clichês que os Rafinha e trupe incorporam ainda podem ser testemunhados no dia-a-dia (e, de certa maneira, acabam involuntariamente inspirando, mesmo jornalistas como eu, a pensar de maneira diferente).
Pela data de “upload”, vi que o vídeo de Rafinha circulava pela internet há mais de um ano – o que, claro, me coloca na retaguarda dos mais “antenados”, pelo menos no que se refere a humor de internet. No entanto, a piada não tinha envelhecido – longe disso, parecia “preocupantemente” atual, uma vez que certos clichês custam a desaparecer… É um humor inteligente (crédito de Brooker) e muito bem contado (crédito de Rafinha). Só de não tentar humilhar uma celebridade, não usar nudez ou palavrões, e convidar o público a pensar sobre seu cotidiano, já ganhou um ponto comigo por originalidade. Mas justamente porque o humor contemporâneo parece se apoiar neste tripé que acabei e citar, a piada é também quase fácil.
Sem muito esforço, por exemplo, eu poderia virar o jogo e imaginar (mas jamais atuar, devido à pobreza de meus dons interpretativos) um esquete chamado “Manual de piada” – e que começaria assim: “Preste atenção que o que você vai ver agora é um manual para qualquer pessoa achar que é engraçada e vai ganhar um programa fazendo o que um dia já foi uma piada original”. O vídeo então seguiria instruindo a pessoa a ir com uma fantasia (ou maquiagem, ou aberração visual) até a porta de um evento popular e/ou que vai estar cheio de celebridades. Armado de algumas frases de duplo sentido (sendo um deles sempre o sexual), você deve então abordar quem vem chegando com intimidade, numa primeira tentativa de constrangimento. Se o “entrevistado” passar neste teste, você então insiste com as piadas maliciosas – não se acanhe: abuse dos trocadilhos, inclusive com o nome de quem você está interpelando. No caso de mesmo assim sua “vítima” não demonstrar irritação, parta para o embate corporal, evoluindo da “roçada leve” ao beijo (mas nunca além do “selinho”) – abraços íntimos e puxadas vigorosas, apenas em casos de passividade extrema da pessoa em questão.
Caso tudo isso falhe, olhe para a câmera e dê uma risada – de algo que só você sabe o que é (não precisa nem ser alguma coisa que tenha acontecido, se você for bom e soltar o riso sem vontade). Se, mesmo com todo esse esforço cômico, a cena ainda não parecer engraçada, existe sempre o recurso da edição. Dos efeitos sonoros mais batidos (barulho de soco, mola, ducha d’água, vidro quebrando) às inserções visuais (chifres, caveiras, passarinhos, luvas de boxe, coraçõezinhos), salpique à vontade. Para fechar, faça um comentário supostamente carinhoso sobre a pessoa que você abordou, mostrando que, no fundo, você é um grande admirador dela, e que espera vê-las mais vezes, em outros eventos, para poder repetir a mesma rotina – desculpe, a mesma piada.
Está vendo como é simples fazer você rir?
O problema, justamente, é que fazer humor assim é simples demais. Especialmente nesses tempos, em que todo mundo tem uma ferramenta para mostrar que a sua piada é “a mais engraçada do mundo” – a internet, claro -, estamos quase chegando a um ponto de saturação. E ninguém precisa ser um acadêmico de humor, para concluir que quando todo mundo está contando a mesma piada – oops! Ela já não tem mais graça alguma…
Felizmente, existe sempre talentos que conseguem “dançar fora do quadrado”. O próprio vídeo de Rafinha Bastos, que citei no início do post de hoje – e mais uma boa meia-dúzia de esquetes de sua lavra que também são “hits” no youtube – são um bom argumento a favor dos que querem pensar em humor “moderno” de maneira diferente.
Por que usei o “moderno” na última frase? Ora, porque a forma mais tradicional de humor vai muito bem, obrigado. Falo, claro, de um formato de “sitcom”, mais ligado à dramaturgia, que, apesar de ter sido inúmeras vezes declarado como “morto e sepultado”, dá provas de que ainda têm muito fôlego – para tirar o nosso fôlego, de tanto rir. E aí o exemplos são vários, dos recentes casos de sucesso da TV americana, como “30 Rock” e “Modern family”, passando mesmo por “Glee”, ao melhor da nossa produção nacional, como o perenemente favorito “A grande família”, ou o recém-estreado – e com um excelente “timing” de humor – “Batendo ponto”.
Mas a internet praticamente nos obrigou a descobrir novas maneiras de contar piadas – e aí, nessa nova “conquista do Oeste”, é inegável que tem gente, como Rafinha, que já saiu na frente. Aliás, deve ter muito mais gente como ele, com bons esquetes embaláveis num formato que se encaixe perfeitamente no youtube que eu ainda desconheço (se você tiver algum esquete, algum novo nome de humor para me sugerir, estou aguardando seu comentário – com o respectivo link!). Mas entre tantas descobertas tardias que ando fazendo nesta área, duas me chamaram mais a atenção. Ou melhor, duas me fizeram rir mais do que todas.
A primeira é quase uma tese sobre “meta humor” na internet – um site chamado Found Footage Festival (mal traduzindo, “Festival de filmagens encontradas”). Desde 2004, dois americanos, Joe Pickett e Nick Prueher, começaram a colecionar “relíquias” da “época do ouro do VHS” – um formato de reprodução de vídeos muito popular na época de seus pais (ou talvez seus avós…). Se você fizer um esforço de regressão e visualizar os anos 80, vale a pena lembrar que foi nessa época que as pessoas se sentiram, pela primeira vez, capazes de dirigir seus próprios filmes: o material era relativamente barato, o manuseio simples, e a reprodução era facilitada – bastava só você ter uma grande idéia! E esse, claro, era o problema.
O que Pickett e Prueher juntaram na sua coleção – agora disponibilizada nesse site – são os momentos mais bizarros desse breve flerte entre a ingenuidade e a tecnologia: registros tão absurdos que, ao conferir os vídeos do FFF (como o site é mais conhecido) a pergunta que não sai da sua cabeça é “como alguém teve coragem de fazer isso?”… O resultado, adivinhe, é um riso incontrolável, por conta de uma mistura de anacronismo, excesso de auto-confiança, e pura esquisitice.
A outra boa surpresa é daqui mesmo, do Brasil: um jornal virtual que só publica notícias absurdas, chamado “Sensacionalista” . Descaradamente inspirado na já clássica publicação americana “The Onion” , ele brinca com notícias do nosso dia-a-dia, distorcendo as informações apenas o suficiente para criar uma estranheza a quem lê – e, com isso, provocar o riso. O tom do texto é sério – de reportagem mesmo. Mas o conteúdo é delirante.
O acervo é enorme – e divertidíssimo. Tenho certeza de que você vai fazer sua própria seleção ao visitar o FFF – e ficar totalmente dependente das atualizações do site para sobreviver. Mas, para uma breve introdução, listo aqui alguns dos meus favoritos. Como o “filme” que Arnold Scharzenegger (então ator pouco conhecido) veio fazer no Rio de Janeiro durante o que parece ser, pela roupa de suas “acompanhantes”, o início dos anos 80 – com impagáveis diálogos bilingues. Ou o vídeo de adestramente de gatos – sim, adestramento de gatos – mais surreal que você jamais vai ver. Tem ainda um “musical” que mostra o cotidiano do Papai Noel quando não está trabalhando no Natal – juro que não estou inventando isso! E, talvez o mais inexplicável de todos: um vídeo de um programa que um dia já foi ao ar em um canal de acesso público nos Estados Unidos, que consiste basicamente em um senhor vestido apenas com uma sunga estampada com a bandeira americana, dançando para um semicírculo de pessoas da sua idade – assistindo, ora incrédulas ora indiferentes, ao bizarro espetáculo. Se você sobreviver a esses vídeos, não pare: as possibilidades de se divertir são inúmeras no FFF.
Veja a manchete de hoje, por exemplo, do dia em que estou publicando este post: “NASA vai lançar foguetes a partir de bueiros do Rio”. A “notícia” é, obviamente, calcada em cima de uma explosão real que aconteceu no bairro carioca de Copacabana, na última sexta-feira. Mas o que faz o texto do “Sensacionalista” ser tão engraçado é a associação absurda dos fatos – NASA, foguetes, bueiros, Rio.
É assim com quase todas as “notícias” que eles publicam – com uma “taxa de acerto” (o nada científico índice de coisas que eles escrevem e que, de fato, fazem você rir) de 90%. E, o melhor, sem nunca apelar para a muleta da baixaria – nem fazer inimigos. Só para ilustrar: a coisa mais fácil, há meses, é fazer piada com Geisy Arruda – a estudante que foi achincalhada por usar um vestido curto demais em sala de aula, no final de 2009. Gracinhas de duplo sentido, ou degradantes, sobre ela existem aos montes. A saída do “Sensacionalista”? Veja a “elegância” da manchete: “Falta de notícias sobre Geisy Arruda faz polícia invadir sua casa: ‘Pensamos que estivesse morta’ ” !
Os leitores da minha geração, que frequentavam as praias cariocas nos meados dos anos 80 e se lembram, com saudade, de um jornalzinho meio chinfrim – porém estupidamente divertido – chamado “O Planeta Diário” (sim, que depois evoluiu para o império do humor chamado “Casseta & Planeta”), têm direito a achar que já ouviu essas piadas antes. Mas, assim como o antigo “Planeta” – feito por um time de humoristas tão brilhante que entrou para o imaginário do brasileiro -, o “Sensacionalista” renova o frescor de algo que, por pura preguiça (nossa, dos ouvintes), esquecemos que ela existe: a arte de contar piadas!
E já que estamos neste astral, deixo você hoje com uma das coisas mais sensacionais – e engraçadas – que vi nos últimos dias (e acredite, com o inevitável mau humor que vem junto com a dieta que estou fazendo, tudo que tenho procurado é coisas que me façam rir). É o encerramento, na última sexta-feira (01 de abril) de um dos melhores “talk shows” da TV americana, “Late Night with Jimmy Fallon” – Rafinha Bastos assiste, tenho certeza… Numa espécie de apoteose musical, ele termina seu show convidando o humorista Stephen Colbert (uma espécie de “deus” do humor americano) para cantar uma versão de “Friday” – sim, Rebecca Black (atualmente com mais de 82 milhões de acessos no youtube) -, junto com uma banda venerada de hip-hop chamada The Roots. Se, como acontece comigo, só a ideia de colocar todas essas coisas juntas já tira você do sério, prepare-se para um choque: este vídeo vai iluminar sua semana!
http://g1.globo.com/platb/zecacamargo/2011/04/04/como-criar-humor-fazer-amigos-e-influenciar-pessoas/