Bom dia pessoal, tudo bem? Em celebração à Semana Mundial do Riso, iniciada no último dia 06/maio, compartilho com vocês um dos melhores
artigos que já li sobre o riso. Foi escrito em 2001 pela Dra. PhD. Silvia Helena Cardoso, psicobióloga,
mestre e doutora em Ciências. Fundadora e editora-chefe da revista Cérebro
& Mente. Pesquisadora do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade
Estadual de Campinas. Ele foi publicado no site Cérebro Mente em 30/06/2002 com o título “O Poder do Riso”. Confiram abaixo a sua íntegra:
Pense na última vez que você riu. Foi por alguma situação engraçada? Ou
por alguma piada? Ou por uma sátira que viu na TV? Talvez por nenhuma dessas
razões. Muito provavelmente não houve uma razão especial e você riu ou sorriu
ao cumprimentar alguém, quando conversava com amigos ou quando brincava com
alguém.
O riso é universal na espécie humana e uma das coisas mais comuns que
fazemos. Nós rimos muitas vezes por dia e em situações extraordinariamente
diversas, mas não percebemos isso, porque raramente controlamos conscientemente
o nosso riso. O neurobiologista Robert Provine, ao observar 1200 conversações
em locais públicos como shopping centers, salas de aula, lanchonetes, ruas,
etc, descobriu que 80% do nosso riso não tem nada a ver com humor. Nós rimos
essencialmente em situações sociais e geralmente em momentos de felicidade,
prazer e brincadeiras, mas sabemos que ele é muito mais do que apenas uma mera
manifestação de alegria. Ele também atenua hostilidade e agressão (repare como
utilizamos o riso quando queremos atenuar uma típica tensão entre estranhos ou
necessitamos dizer não a alguém. Nós frequentemente rimos quando nos
desculpamos. O riso desarma as pessoas, cria uma ponte entre elas e facilita o
comportamento amigável.
Tudo isto indica que o riso é um elemento importante de nossa biologia
comportamental humana. Ele parece ter sido selecionado pela evolução como um
dispositivo importante para a nossa sobrevivência. Entender o riso significa
compreender as nossas raízes sociais e biológicas e aprimorar as nossas
relações sociais.
Por que nós rimos?
O riso, como qualquer outro comportamento emocional, tem uma função e o
riso não é exceção. A função do riso é a de comunição. É uma mensagem que nós
enviamos às outras pessoas comunicando disposição para brincar, ligar-se a
elas, ficarmos felizes e fazê-las felizes, mostrarmos que somos pacíficos.
Nós somos criaturas que necessitamos criar estruturas sociais e viver
bem. Então nós precisamos ter relações pacíficas com as pessoas ao nosso redor.
O riso promove efeitos positivos em nossos contatos sociais.
A função social do riso pode aprofundar-se ainda mais. Estudos
mostraram que indivíduos socialmente dominantes como chefes executivos ou
tribais usam o riso para controlar seus subordinados. Quando o chefe ri, os
subordinados em geral também riem. O riso é então uma forma de expressar o
poder? O filósofo John Moreall especula que desta forma, os chefes estão
"controlando o clima emocional do grupo". Dr. Provine e sua equipe
observaram que as mulheres em uma audiência riem mais quando o palestrante é um
homem.
Precisamos dos risos e das brincadeiras para interagirmos como
indivíduos com o grupo social no qual nos inserimos, e também para aliviar as
tensões sociais do cotidiano. O riso, as cócegas e as brincadeiras estão
entrelaçados de formas bastante complexas e são uma das nossas primeiras
experiências de vida.
Nós aprendemos a rir?
Será que aprendemos a rir desde bem pequenos, principalmente com nossos
pais? Tendemos a pensar que um bebê poderia estar rindo por imitação, mas
evidências apontam que o riso possui uma base inata, pré-progaramada. Estudos
com cegos, surdos e mudos congênitos, por exemplo, provaram que eles podiam rir
e sorrir, mesmo sem a possiblidade de imitar outras pessoas. Recentemente
observamos o riso em crianças cegas congênitas e verificamos que eles riem como
qualquer criança normal e pelos mesmos motivos, ou seja, por brincadeiras,
cócegas, ao ouvir músicas alegres, etc.
Clique aqui para ouvir o riso de uma criança cega congênita.
Os animais riem?
Se o riso é inato, deve haver evidências para ele no registro
evolutivo. Quando observamos primatas próximos aos humanos, nós vemos que o
riso não é único a nós mesmos. Os antropóides (chimpanzés, gorilas e
orangotango) abrem suas bocas, expõe seus dentes, retraem os cantos da boca, e
emitem vocalizações altas e repetitivas, não como o riso dos humanos, mas sons
mais parecidas com guinchos ou granidos ou até mesmo através de certas posturas
corporais. Eu não acho isso surpreendente, porque nós somos somente uma entre
as espécies sociais e não existe razão pela qual deveríamos ter um monopólio
sobre o riso como uma ferramenta social.
O riso pode ter evoluído até mesmo antes dos primatas aparecerem em
cena. Ratos, quando estão brincando com seus companheiros, emitem vocalizações
que são interpretadas como riso. Estudos realizado pelo neurobiologista
americano Jaak Panksepp mostraram que ratos emitem vocalizações ultrasônicas
durante o comportamento de brincar de rolar no chão. Pansepp sugere que ratos e
primatas, especialmente os jovens, usam o riso para distinguir de interações
físicas ameaçadoras. Nós observamos filhotes rolar no chão com os outros,
mostrar os dentes e ameaçar morder e perseguir o companheiro. Para nós, eles
claramente estão brincando com esta luta de faz-de-conta, mas, vocalizações
súbitas do comportamento, incluindo vocalizações, sinalizam a seus parceiros
que a luta não é séria. A inabilidade de um filhote de rato vocalizar por causa
de um dano cerebral, pode levar a uma luta séria. Crianças de todas as idades,
e, em muitas culturas, e também pais e filhos, também se engajam em
brincadeiras de rolar no chão, de dar socos, mas sempre acompanhados pelo riso.
A importância do riso e das
brincadeiras
O riso é uma das nossas primeiras experiências de vida. Ele dá início a interação com o mundo ao
nosso redor. O ato de brincar é essencial para a aprendizagem e para forjar
ligações sociais. Precisamos dos risos e das brincadeiras para interagirmos
como indivíduos com o grupo social no qual nos inserimos, e também para aliviar
as tensões sociais do cotidiano. Alguns cientistas acreditam que as
brincadeiras são parte essencial da formação do caráter. Quando brincamos,
simulamos e desenvolvemos as mesmas situações cotidianas que viveremos mais
tarde durante a vida adulta. Ou seja, essas brincadeiras físicas vitais e
precoces ensinam-nos o alto controle e o comportamento social de que
precisaremos na idade adulta. Isto ocorre quando nós aprendemos a usar o riso
para indicar que a brincadeira agressiva é só uma brincadeira. Como
consequência, formam-se ligações emocionais positivas.
Na faculdade de Ohio, o renomado cientista Dr. Jaak Panksepp, encontrou
evidências de que as brincadeiras são uma necessidade básica partilhada entre
as espécies, e que serve como uma forma de trabalhar o jogo de dominação e
submissão entre indivíduos do mesmo grupo social, de forma não-violenta. Isso
nos leva a concluir que as brincadeiras e o riso têm o significado da
competição entre os indivíduos de uma mesma espécie e grupo social. E nos ajuda
a entender as sutilezas das relações sociais, aprendendo a ganhar e a perder,
dominar e ser dominado socialmente. O contexto da brincadeira de rolar no chão,
perseguir, usar expressão de ameaça é o seguinte: "Vou te atacar e te
matar, mas quando o riso se entrelaça nessa brincadeira ele sinaliza: mas não
vou machucá-lo, é tudo uma brincadeira.
O comportamento de brincadeira é universal entre os mamíferos. Brincar
de rolar no chão é como simular um ataque. A vocalização típica nestas
situações, indica que isso é só um faz de conta. A brincadeira é essencial para
a aprendizagem do alto controle e o comportamento social de que precisaremos na
idade adulta e para forjar ligações sociais.
Ouça a vocalização do macaco e do rato quando estão brincando
O riso é um reflexo primitivo que nós dividimos com alguns animais. Mas
o riso humano involve regiões cerebrais altamente desenvolvidas que nos permite
por exemplo, entender uma piada. .
O riso é um bom remédio
O riso está associado não somente com o alívio de tensão induzido pelo
perigo e sinalização não agressiva, mas também com a expressão de emoções
positivas. Isto poderia ser a base para a a expressão bem conhecida
mundialmente de que "o riso é um bom remédio". Pesquisas sérias têm
mostrado que esta noção é verdadeira. Riso e humor diminuem estresse e
ansiedade, reforça a imunidade, relaxa a tensão muscular e diminui a dor. A
Medicina moderna está começando a levar vantagens destes efeitos positivos:
crianças hospitalizadas que vêm palhaços brincando permancem menos tempo nos
hospitais que aquelas que não vêm.
O riso inicia uma cadeia de reações fisiológicas. Primeiro, ele ativa o
sistema cardiovascular, então a freqüência cardíaca e pressão arterial
aumentam. As artérias então se dilatam, levando, portanto, a uma queda da
pressão. Contrações fortes e repetidas dos músculos da parede torácica, abdomen
e diafragma aumentam o fluxo sanguíneo nos órgãos. A respiração forçada (o ha!
ha! ha! do riso) eleva o fluxo de oxigênio no sangue. A tensão muscular diminui
e nós podemos temporariamente perder controle dos nossos membros, como na
expressão "ficar fraco de tanto rir". Pessoas que sofrem de raiva
crônica têm alta incidência de pressão sanguínea elevada, níveis mais altos de
colesterol e ataques card;iacos. Enquanto a raiva, a depressão e frustração
perturbam a função de muitos sistemas fisiológicos, incluindo o sistema imune,
o riso ajuda estes sistemas a funcionarem melhor. Por exemplo, o riso ajuda o
sistema a aumentar o número de células que auxiliam contra a infecção, as
células T, no sangue. O riso também pode promover mudanças hormonais benéficas.
Cientistas especulam que o riso libera transmissores neuroquímicos chamados
endorfinas, os quais reduzem a sensibilidade à dor e promovem sensações
prazeros e de bem estar.
Um mundo melhor com o riso
Riso e brincadeira são elementos vitais em nosso repertório
comportamental humano. Dr. Panksepp sumariza isso com sabedoria e beleza: “Riso e brincadeira fertilizam não somente o
cérebro, mas fertilizam também o espírito humano. Estes são tipos de sistemas
que nos permitem ser brincalhões, construir estruturas sociais estáveis e
manter unidas criaturas que fazem coisas certas no mundo. Se outras pessoas
estão interagindo com nós de forma positiva e nós respeitamos a forma como elas
sentem, então eu acho que nós temos um mundo melhor. E o riso e a brincadeira
são grande parte disso”.
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